CBDC: entenda sobre as moedas digitais emitidas por bancos centrais

No Brasil, moeda está em fase de testes pelo Banco Central e o real digital deve ser lançado até 2024

Por Paulo Carvalho  /  18 de janeiro de 2024
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O mercado financeiro tradicional vivencia uma transição para a economia digital, onde criptomoedas e a tecnologia blockchain estão sendo incorporadas em produtos e serviços oferecidos por empresas que atuam no sistema bancário financeiro. Por isso, muitos países estão desenvolvendo suas CBDC (Central Bank Digital Currencies), sigla que se refere a moeda digital emitida pelo Banco Central.

O interesse em criar essas moedas digitais cresceu no início da pandemia provocada pelo novo coronavírus. De acordo com um relatório da Atlantic Council, mais de 130 países estão envolvidos em projetos de CBDCs.

Embora parte desses projetos esteja em fase inicial de desenvolvimento, o interesse em CBDCs apresentou um crescimento superior a 300% quando comparado a 2020. Assim, o número de países saltou de 35 para mais de 100 em menos de três anos.

Um dos maiores projetos de CBDC é o yuan digital (e-CNY). Enquanto a moeda brasileira está na versão piloto, a China começou a desenvolver a dela em 2019. Mais de 100 bilhões de unidades da moeda foram emitidas e mais de 260 milhões de chineses possuem carteiras digitais compatíveis com a moeda. Em 2022, atletas e espectadores usaram o e-CNY durante os Jogos de Inverno no país.

Conheça projetos de CBDCs no Brasil e em outros países:

O que é CBDC?

A sigla CBDC se refere a moedas digitais emitidas por bancos centrais. Cada país utiliza um tipo de tecnologia para emitir seu próprio dinheiro. Então, o processo de emissão pode variar.

A emissão da CBDC pode ser a partir das diretrizes do Banco Central responsável pelo projeto, parcerias entre bancos centrais de países distintos ou atrelando o preço a uma reserva do ativo. Para isso, basta depositar uma unidade da moeda fiduciária como o dólar, real ou euro em uma reserva.

CBDC unificada

Enquanto a maioria dos países desenvolve sua própria CBDC, a Arábia Saudita e o Emirados Árabes Unidos se uniram para criar uma moeda digital unificada. Segundo o projeto, os bancos centrais dos dois países do Oriente Médio vão emitir a moeda digital Aber.

Como os dois países possuem sua própria moeda fiduciária, o preço da CBDC será lastreado tanto no dirham, usada nos Emirados Árabes Unidos como na riyal saudita, da Arábia Saudita.

Entre 2019 e 2020, a moeda ficou em fase de testes. A etapa foi concluída com sucesso e nenhum problema foi identificado. O desempenho da moeda digital foi positivo. Além de cumprir os requisitos de privacidade e descentralização de dados, a emissão dupla não afetou o uso da CBDC para pagamentos fronteiriços.

Em uma comparação com sistemas centralizados de pagamento, a moeda digital dos dois países apresentou melhor desempenho em transações financeiras do que sistemas convencionais utilizados atualmente no mercado. Entretanto, não há uma data oficial para o lançamento da moeda digital no mercado.

Inicialmente, o projeto testou tecnologias como a blockchain e o registro distribuído (DLT) de dados para criar um ecossistema descentralizado para a CBDC. Após essa fase inicial de testes com pagamentos transfronteiriços, o próximo passo envolvendo a moeda digital dos dois países consistirá na criação de uma política de uso para o ativo digital, além de mais pesquisas sobre o projeto.

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Qual a função da CBDC?

A CBDC é um ativo digital emitido e controlado por bancos centrais em todo o mundo. Mas, embora seja classificada como um ativo digital, ela não é uma criptomoeda. Por representar uma versão digitalizada do dinheiro físico, a moeda digital controlada por bancos centrais é um ativo digital. A expectativa é usar a versão CBDC para:

  • Pagamentos;
  • Envio de valores;
  • Transações transfronteiriças;
  • Câmbio.

Entretanto, o principal objetivo para criar a moeda digital controlada por bancos centrais é atender o comércio exterior e transações transfronteiriças.

China e o yuan digital

A China foi um dos primeiros países no mundo a iniciar o desenvolvimento de sua própria CBDC.
Foram mais de 150 milhões de transações por 140 milhões de pessoas, incluindo 10 milhões de contas corporativas, registradas desde o teste do projeto.

De acordo com a Bloomberg, os cidadãos operam a CBDC chinesa em carteiras digitais, sendo necessário apenas o número de telefone. Existem quatro tipos de carteiras digitais para armazenar o yuan digital (e-CNY) e os dispositivos variam conforme o processo de verificação de informações cadastrais. Conforme mais informações exigidas, maior o limite de transações da carteira.

Antes do lançamento no mercado financeiro, foram feitos diversos testes, incluindo transações transfronteiriças. O país usou o ativo digital para negociar gás natural liquefeito (GNL) em março de 2023 e petróleo em outubro de 2023.

A transação de gás aconteceu após a empresa TotalEnergies aceitar receber a CBDC chinesa, em uma negociação de GNL com a China National Offshore Oil Corporation (CNOOC). A Bolsa de Petróleo e Gás Natural de Xangai (SHPGX) anunciou que a empresa PetroChina negociou cerca de 1 milhão de barris de petróleo com o yuan digital, valor equivalente a quase US$ 100 milhões. Além da China, a Venezuela também já negociou petróleo usando uma moeda digital, esta se chamava petro e tinha o preço atrelado ao barril do combustível.

Segundo o China Daily, o uso do yuan digital está aumentando na China, principalmente para transações transfronteiriças. Somente no primeiro trimestre de 2023 foi movimentado cerca de US$ 1,39 bilhões de e-CNY em pagamentos internacionais. Inclusive, a China e os Emirados Árabes Unidos firmaram uma parceria para o desenvolvimento e uso de CBDCs. Os dois países fazem parte da mBrigde, uma ‘ponte’ para incentivar o uso de diferentes CBDCs em transações transfronteiriças.

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Por que os BC estão desenvolvendo moedas digitais?

Além da digitalização da economia, outro movimento impulsiona essa adoção virtual dos ativos de valor: a tokenização. Esse processo é responsável por criar a representação virtual de ativos físicos como bens, produtos, serviços e moedas fiduciárias.

Portanto, as CBDCs estão sendo desenvolvidas para atender a demanda de uma nova etapa da economia, onde o mercado cripto está se consolidando e o mercado financeiro está passando por uma reestruturação com o processo de tokenização de ativos.

Os países que compõem o G20 e o G7 estão acelerando a adoção de moedas digitais emitidas por bancos centrais, com a maioria em desenvolvimento final ou fase de testes. Alguns dos países que estão desenvolvendo CBDC própria são Jamaica, Índia, Tailândia, Austrália e Rússia. Além deles, o Banco Central Europeu (BCE) também está desenvolvendo uma versão digital do euro e o projeto deve ser testado na União Europeia em 2024.

Quais são as diferenças entre CBDCs e stablecoins?

A primeira diferença está relacionada à tecnologia de cada ativo. Enquanto a maioria das CBDCs usam gerenciamento de dados descentralizados, as stablecoins usam a tecnologia blockchain. Ainda assim, existem CBDCs que usam a blockchain como sistema emissor de moedas digitais.

Além da tecnologia, a emissão difere por conta de como a reserva de valor é feita. No caso das stablecoins, os projetos contam com uma reserva de valor na moeda fiduciária na qual o ativo digital está atrelado. Enquanto isso, as CBDCs tem uma reserva de valor flexível que deve corresponder as condições de cada banco central responsável pela emissão do ativo.

Na opinião de Sandra Ro, CEO da Global Blockchain Business Council (GBBC), durante o Web Summit Rio 2023:

“Os próximos anos serão muito interessantes, porque muitos governos lançarão CBDC. Muitos bancos e instituições do setor privado lançarão moedas estáveis. E acho que haverá uma batalha. Talvez haja um papel para ambos. Mas acho que cada país ou jurisdição terá uma tentativa interessante de descobrir a que lugar eles pertencem. E eu não acho que vai ser o mesmo para todos os países. Eu acho que é realmente diferente.”

Para o presidente do Banco Central da Austrália, Philip Lowe, as stablecoins privadas são melhores que as CBDCs (Central Bank Digital Currencies). Ele explicou em uma conferência do Ministério das Finanças e do Banco Central do G20 em Bali que a adoção massiva de stablecoins depende de uma regulação e comparou o ativo digital com a movimentação de dinheiro entre bancos e CBDCs.

Segundo ele, stablecoins devem ser reguladas assim como os depósitos bancários, por isso, defendeu a criação de uma legislação para stablecoins. Inclusive, ele defendeu que o setor privado tende a ser mais inovador além de captar mais recursos para um projeto de moeda digital.

“O setor privado é melhor do que o banco central em inovar e projetar recursos para esses tokens, e também é provável que sejam muito significativos custos para o banco central que cria um sistema de token digital.”

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Drex: saiba sobre o real digital

O Brasil faz parte do grupo de países que estão desenvolvendo sua própria CBDC. O projeto organizado pelo Banco Central se chama Drex, sigla de “Digital Real Eletrônico X”.

Entre 2022 e 2023, o real digital passou por testes envolvendo soluções financeiras criadas por meio do Lift, um programa de aceleração de soluções lançado no final de 2021. No início de 2023, o Lift apresentou um teste do real digital sendo emitido e transacionado por meio de uma blockchain pública. Na fase de testes, o Banco Central confirmou a segurança dos dados e a viabilidade do uso da tecnologia na emissão do real digital.

Os primeiros testes da versão piloto começaram em janeiro de 2024. Conforme o Banco Central foram mais de 500 transações com a moeda digital incluindo operações no mercado de varejo e atacado. Nessa primeira fase 11 instituições financeiras participaram como nós validadores da rede.

Portanto, as primeiras transações com o Drex já aconteceram em um ambiente de testes. O Banco Central também emitiu títulos públicos a partir do Drex, o que serviu para simulações de compra e venda desses títulos entre os participantes do consórcio do real digital.


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